quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Ação revisional de contratos

Entenda como funcionam as chamadas "Ações revisionais de contrato", muito comentadas nos últimos tempos por conta das abusivas taxas de juros cobradas em financiamento
Com o aquecimento do mercado interno nos últimos tempos -- graças à facilidade de condições para compras --, o consumidor brasileiro viu aí sua oportunidade de adquirir novos bens, como eletrodomésticos, eletroeletrônicos e até mesmo realizar o sonho de comprar um veículo.
Porém, ao passo em que as condições das lojas tornaram-se mais acessíveis ao consumidor, também aumentaram os casos de dívidas oriundas de financiamentos, crediários e de produtos bancários. Quando o consumidor não mais consegue pagar seu bem adquirido, ele acaba lidando com cobranças e ameaças de sofrer com a chamada “busca e apreensão”, sobretudo no caso dos veículos adquiridos.
Por conta disto, muitos têm adotado às chamadas “Ações revisionais de contrato”, em busca de uma forma de baixar os juros de sua dívida, que, graças a esses mesmos juros, acabam dobrando de valor, tornando-a assim impossível de ser paga pelo próprio consumidor.
A fim de compreender melhor como essa ações são caracterizadas, conversamos com a Dra. Ana Cezario, especialista neste tipo de ação:

MeuAdvogado: O que é uma Ação revisional de contrato?
Dra. Ana Cezario: Ação Revisional de contrato é um pleito judicial que tem por finalidade a revisão de cláusulas abusivas constantes em um contrato realizado entre o consumidor e a instituição financeira, para fins de equilibrar a relação havida, evitando os abusos normalmente praticados, objetivando a redução ou modificação das parcelas ou até a eliminação de seu saldo devedor, além da restituição de valores já pagos indevidamente.
Só para melhor ilustrar, cabe dizer que o “consumidor/cliente”, normalmente assina junto ao Banco um contrato do tipo “Contrato de Adesão”, o qual já esta na forma pré-impressa, sendo assim, é impossível discordar ou arrazoar de qualquer ponto controvertido e/ou clausula abusiva, simplesmente é assinar ou assinar.
MeuAdvogado: Em quais situações o consumidor pode aderir a esta ação? Há um cálculo padrão para saber se os juros de determinado financiamento é abusivo
Dra. Ana Cezario: Qualquer pessoa, tanto Física como Jurídica pode ingressar com ação revisional, pois a todas elas está o direito a favor, bastando ingressar com a ação sempre que for constatada a cobrança de juros onerosos e tarifas ilegais, como:
  • Abusividade da taxa de juros remuneratórios
Taxa de juros remuneratórios de um contrato é a taxa de juros paga pelo cliente durante o período da contratação, sem inadimplência.
Considera-se abusiva uma taxa de juros de um contrato sempre que ela estiver acima da taxa de juros média praticada no mercado para a mesma espécie de contrato. Assim, uma taxa de juros de 3% que pode ser em uma determinada época considerada abusiva para um contrato de aquisição de veículo com garantia de alienação fiduciária, pode ao mesmo tempo e data não ser abusiva para um contrato deempréstimo pessoal, isto porque no segundo caso o risco para quem empresta o dinheiro é maior que no primeiro, pois não existe garantia.
Para verificar na prática se a taxa de juros de um contrato é abusiva ou não deve se comparar a taxa de juros do contrato com a taxa média de juros do mercado a qual é publicada todo mês no site do Banco Central do Brasil.
  • Capitalização (cobrança de juros sobre juros / anatocismo)
A legalidade ou não da capitalização dos juros no Brasil é hoje um dos temas mais controvertidos do direito, pois até o ano de 2000 a não ser em poucas e especiais espécies de contrato a capitalização dos juros era absolutamente proibida, no entanto no ano de 2000 foi editada a Medida Provisória nº 1.963-17/2000, atualmente reeditada sob o nº 2.170-36/2001 a qual tratava de um tema absolutamente sem maiores importâncias, mas a qual trouxe no seu artigo 5º a permissão para a ocorrência da capitalização no direito pátrio.
Tal medida provisória a nosso ver é absolutamente inconstitucional por lhe faltar o requisito da urgência e por regular matéria afeta a lei complementar o que não poderia ser objeto de medida provisória. Em tal sentido o Tribunal Regional Federal da Quarta Região já declarou inconstitucional a MP 2.170-36/2001, e muitos juízes e desembargadores de todo o país também consideram inconstitucional a norma.
Atualmente está em tramitação no Supremo Tribunal Federal uma ação direta de inconstitucionalidade contra a medida provisória 2.170-36/2001, e até agora o julgamento vai no sentido de sua inconstitucionalidade.
  • Comissão de permanência
Comissão de permanência é a taxa de juros a qual o cliente é submetido quando esta inadimplente. O que ocorre é que esta taxa só pode ser cobrada pela taxa média de mercado e limitada a taxa de juros remuneratórios do contrato, mas de regra os banco cobram na comissão de permanência uma taxa de juros acima da taxa contratada e ainda cumulada com correção monetária o que é absolutamente ilegal.
De fato, a comissão de permanência cobrada de forma ilegal é a grande vilã que faz com que uma prestação de um empréstimo pago com poucos dias de atraso vire um monstro, com um acréscimo absurdo de juros e multas, é ela que da nome a taxa de excesso ou inadimplência no cheque especial, e a tantas outras distorções que acontecem nos contratos.
  • Vendas Casada
Para fechar aquele contrato de financiamento ou renovar o seu cheque especial você foi persuadido a comprar aquele seguro que você nem sabe como funciona, ou aquele título de capitalização que nunca quis. Se você respondeu sim você foi vítima da venda casada que ocorre quando as instituições financeiras condicionam a realização de determinada coisa a compra de outra. Tal prática é ilegal, e você tem direito a devolução em dobro dos valores pagos a título de pagamento de produtos adquiridos de tal forma.
  • T.A.C. - Taxa de administração de contratos, Tarifa de Emissão de Boletos, Serviços de Terceiro dentre outras taxas
Os bancos adoram inventar taxas na hora da elaboração de contratos, no entanto a cobrança de uma tarifa contratual para acobertar as despesas administrativas com o financiamento, apesar de não encontrar vedação na legislação expedida pelo BACEN, se mostra abusiva, pois se traduz num em verdadeiro bus in idem, na medida em que o lucro do banco, o qual serve para acobertar todas suas despesas advém de suas taxas de juros, de seu spread, logo a cobrança destas taxas “não se destina, assim, evidentemente, a remunerar um serviço prestado ao cliente”, como referido pelo eminente Desembargados Carlos Alberto Etcheverry, ao tratar do tema, enquadrando dita cobrança como abusiva, nos termos do art. 51, IV do CDC.
O absurdo da prática fica mais evidente quando se compara que sua cobrança equivale a um posto de gasolina cobrar além do custo do combustível uma taxa pela utilização da bomba.
MeuAdvogado: Enquanto o consumidor estiver com a ação revisional em julgamento, ele é obrigado a continuar pagando as parcelas deste financiamento?
Dra. Ana Cezario: Sim, deve continuar pagando normalmente através do boleto. Somente após decisão favorável sobre o pedido de depósito em juízo dos valores que entende devidos (apurados através de cálculo pericial) à luz da legislação, doutrina e jurisprudência, é que o consumidor poderá parar de pagar o boleto e passar a fazer os depósitos judiciais do valor da prestação reduzida.
Assim, é medida de extrema importância o pedido feito à Justiça para o depósito dos valores incontroversos, bem como o pedido de "antecipação de tutela" para impedir que a Instituição Financeira inscreva o nome do consumidor em órgãos como SPC, SERASA, BACEN etc, enquanto o processo estiver sendo discutido e os depósitos feitos, pois a própria dívida está em discussão.
Portanto, é muito importante que o consumidor tenha bem claro o fato de que ao entrar com o processo judicial tem a obrigação de depositar em juízo os valores que entende devidos (recalculados).
MeuAdvogado: Qual é o tempo estimado para que esta ação seja julgada?
Dra. Ana Cezario: O desenrolar da Ação, no fórum, é competência do juiz, e não podemos dar nenhum prazo concreto, pois pode variar muito de Fórum para Fórum e de Vara para Vara. Quanto mais rápido o juiz despachar, mais rápido andará a Ação. Contudo, podemos a título de exemplo, dizer o que tem acontecido até o momento: Temos Ações que já tiveram despacho favorável sobre o pedido de deposito do valor reduzido das parcelas em 05 dias. Outros que após três meses, sequer chegaram a analise do juiz. 
Já em casos em que as ações se resolveram por acordo (muito comum acontecer, uma vez que o banco passa a fazer propostas bastante benéficas) obtivemos resultados em até 30 dias, e outras (também por acordo) levaram até 08 (oito) meses.
MeuAdvogado: E quais as chances de sucesso em tal ação?
Dra. Ana Cezario: Se o cliente fizer todos os depósitos em juízo conforme deferido pelo juiz, a chance de sucesso é grande. De fato, é muito difícil um devedor que tenha efetuado os depósitos judicias de forma correta perder a causa.
Além do que, normalmente as financeiras oferecem um bom acordo para quitação do contrato antes mesmo da sentença final da ação.
O único problema ocorre nos casos onde o devedor entra com uma ação, porem, não realiza os depósitos em juízo e simplesmente para de pagar a dívida.
MeuAdvogado: Em serviços bancários, como cheque-especial, por exemplo, também é possível entrar com a ação revisional?
Dra. Ana Cezario: Sim. As ações revisionais de contrato mais comuns são as ligadas a financiamentos de veículos (consórcios / alienação fiduciária / leasing), de imóveis, crédito pessoal,  cheque especial,  cartões de crédito,  dívidas agrícolas, dentre outros que contenham taxas de juros e outras cláusulas consideradas abusivas. Importante dizer que muitas vezes em uma ação revisional analisamos mais de um tipo de contrato. Ex. Ação revisional contra um banco onde se revisa o cheque especial, os cartões de crédito e todos os financiamentos relativos a uma determinada relação de crédito. (conta corrente)
MeuAdvogado: Em todos os tipos de financiamento é possível ajuizar a ação revisional de contrato? Em financiamentos imobiliários também é possível?
Dra. Ana Cezario: Sim. Como já exposto anteriormente, é possível ajuizar ação para rever clausulas de qualquer tipo de financiamento que contenham taxas de juros e outras cláusulas consideradas abusivas.
MeuAdvogado: Em sua opinião, quando vale a pena ajuizar tal ação?
Dra. Ana Cezario: Sempre que o consumidor estiver sofrendo prejuízos em decorrência da abusividade do contrato e não estiver suportando tal onerosidade. O que acontece na grande maioria das vezes!
Para se ter uma certeza de tudo que foi cobrado e embutido no financiamento e analisar se compensa ou não, o consumidor precisará ter em mãos o seu CONTRATO DO FINANCIAMENTO. No entanto, caso o consumidor não tenha recebido o contrato, poderá solicitar uma cópia junto ao seu Banco. Caso novamente não lhe seja fornecido, poderá entrar com a ação mesmo assim, solicitando ao Juiz que determine que o Banco apresente o contrato nos próprios autos da ação revisional.
MeuAdvogado: O cidadão que ingressa com a ação revisional pode ter seu nome incluído em cadastros restritivos? Há esse risco?
Dra. Ana Cezario: Até o momento, nenhum de nossos clientes sofreu qualquer tipo de retaliação por ter entrado com uma Ação Revisional. Na verdade isso é o que os bancos querem que o consumidor pense! Se eles pensarem assim, não entrarão com a Ação contra eles, e então eles vão continuar cobrando aquilo que bem querem e entendem, e o cliente pagará calado, sofrendo o prejuízo!
O Banco não pode, inclusive fornecer de forma alguma, informação para outro Banco, sob pena de pesada ação de indenização por perdas e danos, abalo de crédito, etc...
Dra. Ana Cezario é advogada em Sorocaba-SP e atua nas áreas de: Direito Civil, Direito Constitucional, Direito do Consumidor, Direito do Trabalho, Direito Penal.

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